da semana opinião de leitora

Obrigar aluno a ler livros clássicos na escola. Seria isso um problema?

Neste post falo sobre minha opinião a respeito da obrigação de leitura de livros clássicos na disciplina de Literatura do ensino médio.

Artigo de opinião

No final do mês passado, a rede social Twitter foi palco para uma discussão do tópico “Crie uma treta literária e saia”. A ideia do tópico era falar a respeito de um assunto literário e dar uma opinião que às vezes podia ser considerada como polêmica (quando é passível a ter muitos comentários discordando dela, por exemplo).

Com o tópico em aberto, várias pessoas falaram as opiniões delas, e como é o de costume, muitos discutiram em relação ao que foi exposto. Um tweet que ganhou bastante visibilidade e causou um longo debate foi o do influencer e youtuber Felipe Neto:

O feedback a respeito dessa opinião foi dividido, com pessoas concordando/discordando. Profissionais da literatura também se envolveram na conversa, como foi o caso de Thalita Rebouças, que defendeu a ideia de Neto:

Alguns internautas mostraram o que acharam do comentário do youtuber, como a conta pessoal abaixo:

Eu peguei a ideia dessa tal “Crie uma treta literária e saia” para discutir aqui no blog sobre um assunto que eu já queria ter trazido há muito tempo. Tive a sorte dele ter tido tanta repercussão por meio desse tópico abraçado pelo Twitter, então aproveitarei para desenrolar o tema neste post. Eis a questão: é correto as aulas de Literatura obrigarem alunos a lerem livros clássicos brasileiros? Seria essa a solução para o déficit de leitores existentes no País?

Artigo de opinião

A maioria das escolas brasileiras possui na grade de aulas do ensino médio a disciplina de Literatura, sejam as escolas públicas ou particulares. A Literatura é extremamente importante para o lado acadêmico do brasileiro, e uma prova disso é a presença dela em várias questões do principal vestibular do País, o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).

Por meio das aulas de Literatura, o aluno conhece mais sobre o Brasil. Conhece um lado da cultura dele que vem das histórias, das páginas, dos autores. O aluno tem a oportunidade de entrar no mundo de uma pessoa de séculos atrás, ver como funcionava a escrita e quais eram os temas mais abordados. Por meio disso, é possível ter uma pequena ideia sobre como aquela sociedade funcionava e como as pessoas viviam, tanto em relação aos relacionamentos quanto aos comportamentos humanos.

Pensando no lado de aprendizado do aluno, no entanto, podemos concordar que a Literatura dos séculos passados era sim, complicada. Afinal, era uma outra sociedade, um outro pensamento; outras palavras eram usadas, outros termos. E isso não é compreendido facilmente por qualquer leitor. Porém, afirmar que a disciplina de Literatura, ao fazer com que o aluno leia livros clássicos, está realizando um desserviço… isso não está correto. Talvez a maneira como Neto se posicionou deixou a ideia torta. Assim como quando ele afirmou: “Álvares de Azevedo e Machado de Assis NÃO SÃO PARA ADOLESCENTES! E forçar isso gera jovens que acham literatura um saco”.

Sobre a leitura de clássicos da Literatura durante a disciplina, é uma obviedade que isso é importante. Se as escolas não incentivassem a leitura desses livros durante as aulas, tais obras poderiam cair no esquecimento entre a população jovem. Além disso, como citado, o incentivo para a leitura deles é necessário para o motivo já citado – os estudantes terem um conhecimento maior sobre a obra/autor. Ao terem acesso ao conteúdo num todo, fica mais fácil de aprender a matéria. Ao falar sobre Machado de Assis, é interessante indicar ao aluno um livro escrito pelo autor.

No entanto, como afirmado por Neto, Álvares de Azevedo e Machado de Assis não são para adolescentes, e eu concordo completamente. Para ler qualquer um desses autores, é preciso ter sim uma maturidade em questão do vocabulário, e é completamente entendível (por minha parte, pelo menos) o desgosto que muitos estudantes têm em ter que ler obrigatoriamente obras clássicas dos séculos passados. É claro que, como mostrado no comentário contra a opinião de Felipe Neto, existem alunos que gostam sim desse tipo de livro, porém, trazendo para este post a minha experiência pessoal sobre isso, posso dizer que nos meus tempos de estudante do ensino médio, ninguém, absolutamente ninguém, gostava de ler os livros que os professores obrigavam veemente, como Memórias Póstumas de Brás Cubas, Capitães da Areia, Iracema, A Hora da Estrela… Nem mesmo eu. E por esse lado, concordo com a ideia de Felipe Neto, sim. Esses autores não são para adolescentes comuns, e sim, para aqueles que têm uma maturidade literária, digamos. Naquela época eu já era uma leitora assídua, mas mesmo assim, não tinha essa maturidade que conquistei posteriormente com muitos anos lendo vários livros.

Dessa forma, meu ponto de vista acaba concordando e discordando da polêmica opinião de Felipe Neto. Enquanto acho que esses livros precisam sim ser explorados durante as aulas – eu odiava as aulas de Matemática mas precisava aprender, certo? O mesmo acontece com os livros indicados na disciplina de Literatura -, concordo que eles podem causar um certo pânico e aversão em estudantes, mostrando um lado da Literatura que é mais cheio de metáforas, mesóclises, palavras pomposas e repleto de pensamentos de uma época desconhecida por adolescentes contemporâneos. E isso pode influenciar na visão da pessoa sobre o prazer da leitura, infelizmente.

Acredito que algo interessante a ser feito durante as aulas é o compartilhamento de obras atuais, o que pode incentivar esses jovens a lerem mais. Quando eu estudava, tive dois ótimos professores de Literatura (eles eram excelentes), no entanto, pecavam em um ponto: ambos julgavam os livros atuais e falavam, por exemplo, que “Harry Potter e Crepúsculo não são literatura” e “Quem lê John Green é gado”. Isso, para mim, é um erro. Enquanto exaltavam autores do passado, rebaixavam quem escreve hoje. Não os julgo porque era uma opinião pessoal deles, dois profissionais que tinham anos e anos de experiência, contudo, ainda acho errado. Eles continuavam afastando os estudantes de livros afirmando que o interessante é a tal “Iracema dos lábios de mel”. Sejamos sinceros… um adolescente que não gosta de ler e é obrigado a ler Iracema com toda a certeza nunca mais pega num livro depois de tal experiência…

Se as aulas de Literatura contemplassem também obras como Senhor dos Anéis e A Culpa é das Estrelas, talvez os alunos se interessassem mais pela ideia de ler. Se os professores permitissem a adesão desses livros mais atuais nas aulas, talvez a troca fosse mais fácil. Se os próprios professores julgam livros, alunos se sentem à vontade para deixar os clássicos de lado.

Falo isso tudo por experiência própria. Tornei-me leitora da água para o vinho, do dia para noite. Comprei A Maldição do Tigre (um livro atual, de fantasia, escrito pela maravilhosa Colleen Houck) por R$9,99, quando eu não comprava livros e nem lia. Naquela época, fiquei encantada com a capa da obra enquanto esperava na fila das Lojas Americas, e me perguntei, “por que não tentar ler, começando por isso?” A partir daí, entrei em um universo que amo completamente. E passei a amar Machado de Assis e Álvares de Azevedo com a maturidade que adquiri com os anos de leitora. Os estudantes precisam de incentivo, então por favor professores de Literatura, o trabalho lindo que vocês fazem pode ficar ainda mais interessante se ele não hierarquizar as obras e permitir a adesão da escrita contemporânea nas aulas. Os adolescentes agradecem.


4 comentários

  1. Você apresentou pontos importantes para o debate, fugindo de opiniões de senso comum. Minha filha no sexto ano do fundamental terá 4 livros ao longo do ano. Nenhum ‘classico’ da literatura brasileira. São livros com temáticas mais atuais como a história de Nelson Mandela, e a biografia de 50 mulheres brasileiras importantes ao longo da história.
    Acredito que se Machado de Assis seja o escolhido, há que se trabalhar de forma integrada com outras disciplinas, como história e português.
    Tudo tem seu tempo, mas concordo contigo: ler Machado de Assis não é desserviço.

    Abraço

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    1. Olá, Gabriel!

      Que bacana! Esses livros que você citou são importantíssimos para o desenvolvimento do aluno e espero que sua filha goste muito deles.
      Concordo plenamente com você em relação a juntar disciplinas para abordar/estudar livros clássicos como os de Machado de Assis. Afinal, não é apenas a língua que é estudada, e sim, todo um contexto histórico que envolve vários e vários ensinamentos. É muito importante!

      Abraços e ótima semana!

      Curtido por 1 pessoa

  2. Muito boa reflexão. Li muitos livros clássicos durante a infância e que com certeza me acrescentaram muito, apesar de que penso que talvez não tenha tirado o verdadeiro sentido de cada um deles.
    Abraços,
    Gustavo Woltmann

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